Descongestionante
nasal vicia e pode mascarar males maiores, dizem médicos
Crianças menores de 12 anos não devem usar descongestionante nasal sem
acompanhamento
Seja verão ou inverno, quando
surge a baixa umidade do ar ou
aumentam os problemas respiratórios graças aos casos de gripes, resfriados e rinites, o nariz entupido é o sintoma mais
comum e incômodo. A maioria das pessoas não pensa duas vezes em ir à farmácia e
comprar um descongestionante nasal por conta própria, achando que usar o produto
sem acompanhamento médico não trará problema.
E assim começa um dos casos mais clássicos de "vício"
em um medicamento, com direito até a declarações em páginas de redes
sociais como o "Clube dos Viciados" de um descongestionante
conhecido.
"O descongestionante nasal
deve ser usado por, no máximo, cinco
dias consecutivos, e de oito em oito
horas. Se a pessoa continuar a usá-lo, haverá um efeito rebote: para de tomar e o nariz entope novamente e só
melhora se pingar o remédio para desobstruir. A pessoa já leva o medicamento no
bolso e acaba encurtando os intervalos de aplicação", conta a pediatra
Edina Mariko Koga da Silva é diretora do Centro Cochrane do Brasil, uma
organização não governamental que elabora, mantem e divulga revisões
sistemáticas de ensaios clínicos.
A médica frisa que as pessoas
tomam sem sequer ler a bula, não procuram um médico e, assim, o uso do
medicamento torna-se crônico. Ela também lembra que os que sofrem mais são
aquela que moram em grandes centros urbanos, por causa da poluição.
"Também há o problema dos 'edifícios doentes'", afirma.
Ela se refere à má qualidade do
ar interno de alguns edifícios, o que passou a ser conhecido mundialmente como "Síndrome dos Edifícios Doentes",
decorrência de uma conjunção de fatores que vão desde os problemas no projeto até a má
conservação dos dutos e dos aparelhos
de ar-condicionado, causando dois tipos básicos de contaminação: a biológica
por fungos, bactérias, vírus e
protozoários e até mesmo aracnídeos
como é o caso dos ácaros e, a química proveniente de gases liberados por produtos de limpeza, vernizes, tintas,
equipamentos de escritório, colas, aumento no nível de dióxido de carbono etc.
Sem controle
O otorrinolaringologista Antônio
Carlos Cedin, chefe do serviço de Otorrinolaringologia do Hospital Beneficência
Portuguesa e Presidente da Sociedade Paulista de Otorrinolaringologia, também
alerta que o descongestionante nasal, hoje em dia, é um dos principais itens
com os quais as pessoas se automedicam, pois é vendido livremente e sem controle.
"Quando há contração da
circulação dos vasos sanguíneos, o sangue não chega à cavidade do nariz. É o
caso da rinite alérgica, quando os
tecidos nasais incham, impedindo que o sangue chegue. A pessoa usa o
descongestionante e melhora, mas o efeito é passageiro. Quanto mais potente o
remédio, a dilatação volta mais forte. Se usado sem prescrição correta e por
tempo prolongado, as pessoas têm maior facilidade de se tornarem dependentes. É
uma dependência física, química e psicológica, porque proporciona uma
satisfação no respirar", enfatiza o médico.
Contraindicação
É preciso lembrar que o
descongestionante nasal é contraindicado para quem tem problemas na próstata, hipertensão e arritmia cardíaca
e pode causar retenção urinária e
insônia. "Em menores de um ano
o descongestionante pode gerar até mesmo convulsões", avisa Cedin.
No caso de rinite, o
otorrinolaringologista comenta que medicamentos
via oral, como antialérgicos, regulariam o entupimento nasal. Porém, frisa
que é preciso fazer um diagnóstico correto do motivo da obstrução, tratar essa
situação de dependência e descobrir o fator desencadeador.
Cedin é enfático: "Se for
uma queixa recorrente, não pode simplesmente comprar na farmácia e se
automedicar, o que pode até mascarar algo mais sério. É preciso muito critério
e indicação médica. O uso deve ser feito em alguns casos e sempre num
curtíssimo espaço de tempo".
Quando o problema for algo grave,
ele recomenda tratar com medicamento ou cirurgia, como nos casos de desvio do septo ou adenoides (duas
pequenas glândulas compostas por tecido linfoide, semelhantes às amígdalas e
aos linfonodos) que se crescerem muito e podem causar obstrução da passagem do
ar respirado pelo nariz.
"Se a pessoa for para a
praia, tirar umas férias e mudar de ares, por exemplo, a rinite melhora
bastante. Para ajudar a desobstruir o nariz no dia a dia, o indicado é o soro fisiológico e a solução salina no
lugar do descongestionante", ensina a pediatra.
Estudo
Um estudo realizado no exterior,
em 2009, pelo Instituto Cochrane mostrou que a utilização do medicamento traz
uma porcentagem de melhora muito baixa. Aqui o resumo da pesquisa:
"O resfriado é a razão mais
comum de doenças entre os adultos, que podem experimentar de dois a quatro
episódios por ano. Por enquanto, ainda não há cura para este mal, assim, a
diminuição de seus sintomas é o foco do tratamento. A congestão nasal é o
sintoma mais comum. Descongestionantes orais ou nasais são frequentemente
utilizados.
Sete ensaios foram feitos para
determinar o benefício de uma dose de descongestionante, mostrando uma melhoria
de 6 % nos sintomas relatados. A melhoria nos sintomas continuou em 4 % das
pessoas mesmo após três a cinco dias de uso. Essas melhorias foram conseguidas
graças à redução na resistência das vias aéreas nasais.
Dois ensaios foram usados para
determinar a probabilidade de efeitos adversos do uso de descongestionantes
sobre o tratamento não eram mais prováveis do que com placebo. O efeito adverso
mais comum no tratamento foi insônia (5%). Analisamos o uso de
descongestionantes em crianças, mas apesar da alta incidência do resfriado
comum entre elas, não havia provas desse medicamento ser adequado para a
inclusão. Descongestionantes fornecem alívio de curto prazo de obstrução nasal
para adultos com resfriado comum, mas não são recomendados para crianças
menores de 12 anos".
do UOL 24/07/2014
Cármen Guaresemin
Do UOL, em São Paulo
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